Uma urbanização construída nos finais dos anos 70 pela Compave e que depois passou a admnistração para a Sapul. Eram 63 ou 64 prédios, hoje são mais. Vivi ali dos 6 aos 13 anos, vivi ali tempos fantásticos da minha infância. Ontem e hoje não sei porquê andava a recordar esses tempos. Nostalgias.
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Lembrei-me dos meus amigos da altura eram; pretos, monhês, caras pálidas e alguns macaenses. Jogávamos à bola, faziamos campeonatos de corridas, muita bicicleta, andávamos à porrada entre muitas outras - grandes tempos. Nas nossas cabeças não havia a concepção de racismo, pois éramos todos iguais, miúdos que apenas queriam brincar, nem sabíamos o que isso era. Na altura estava na moda o hóquei em patins, improvisávamos uns sticks, as balizas eram de ferro de umas obras abandonadas e que eram iguaizinhas às verdadeiras, e com, uma bola de ténis faziamos campeonatos do caraças. Quando os meus Pais mudaram para a cidade a questão do racismo fazia-me alguma confusão. O pensamento era diferente e não entendia bem o porque é que se fazia diferenças.
Racismo? Mas não somos todos da mesma raça, a Humana?
Por isso, digo-vos em boa verdade que o racismo é uma das maiores estupidezes da humanidade.
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No verão ia um mês para a casa dos Avós.
Do lado paterno para uma aldeia ao pé de Viseu, quando chegava era uma alegria. A miudagem juntava-se todos os dias para brincar às escondidas. Recordo-me do Zézinho meio embrutecido das sopas de cavalo cansado. Quando acompanhava o meu Avô à taberna, taberna multi-disciplinar, pois era, café, mini-mini mercado e jogáva-se às cartas forte e feio. Apostavam copos de tinto carrascão cheios quase a verter e bebidos de penalti e pumba com toda a força no balcão. Cada cartada era jogada com estrondo na mesa. Homens do campo humildes e com uma força tremenda, diziam que a força vinha da carne, do vinho e do bagaço. A garagem era uma adega e na sua sombra fresca bebiam um tinto, comia-se um presunto com pão e cortava-se umas fatias de queijo com a navalha, enquanto observavam os putos reguilas a jogarem à bola e falavam dos tempos difíceis que tinham passado. Putequinho cheguei a fazer vindima na adega do meu Avó e dos amigos. Viviam em comunidade e ajudavam-se uns aos outros. O tinto que fazia era fraquinho tinha prá aí uns 10º (mas era de qualidade pois não tinha misturas químicas) e guardava um pouco da colecta para fazer aguardente.
Acompanhava a minha Avó às vezes à praça, ela e as outras velhotas levavam as cestas pesadas na cabeça com um equilíbrio notável. Vendia couves, agriões, grelos e batatas do próprio quintal. Não tinha a quarta classe mas fazia contas com uma habilidade natural.
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Os outros quinze dias eram em Castelo Branco, local dos Avós maternos, no centro da cidade. Os amigos eram os filhos do dono do café ao lado, o filho de um dos sócios da Pensão à frente, o filho do Alfaiate da outra rua e outros que apareciam. Iamos para o parque da cidade, andavámos de baloiço até chegar à altura da trave que o sustentanva e atirávamos-nos para a frente a ver quem chegava mais longe. Os joelhos andavam sempre raspados e tingidos de mercúrio. Iamos também para o Passeio (só albicastrense é que percebe) onde ficava o meu Avô com os outros velhotes a falarem da Vida, dos problemas, de África e do País. À noite brincavamos às escondidas até tarde. Hoje é impensável.
A minha Avó tinha montes de livros e dava-me a ler os livros dos adultos, estimulando no neto o gosto pela leitura.
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Viseu e Castelo Branco cresceram são cidades diferentes dos meus tempos de criança. Vou a Viseu para visitar a minha Avó viva. Aproveito para ir ao cemitério da aldeia, umas das vezes sózinho, deixo-me estar quieto e respeitando o local, observo as fotografias das campas, estão lá todos os velhotes da minha infância, a minha Avó é a última viva daquela geração. Fico quieto e recordo-me daqueles tempos, com o efeito de evocatio, começam a aparecer, faz um friozinho (do tipo brisas), cirandam à minha volta, trespassam-me cheios de pensamentos da época que lhes faço recordar, deixo-me estar um pouco cá e com um pé lá. Volto ao intrafísico e vejo uma velhota ao fundo a lavar a campa dos seus entes queridos. Volto para o carro e vou-me embora.
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De vez em quando vou à Cidade Sol de carro, hoje guetizada e degradada, olho para o parque infantil votado ao abandono, até me dá um nó na garganta. Quando antes impecável e com as pinturas da associação de moradores da época, vibrava com a criançada.
A incúria dos governantes locais e centrais, induziram a política dos bairros sociais, para varrerem as barracas das cidades criando guetos incontroláveis sociologicamente.
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Hoje as crianças vão para a escola acompanhadas e têm um carro da PSP Escola Segura para os proteger. Criam-se hordas de monstrinhos, que ficam em casa a jogarem na playstation ou na internet através do msn com uma linguagem do tipo - kero, axo, pq, etc. Promove-se o individualismo e o consumismo desenfreado. São os pequenos ditadorzinhos dos pais. Que geração estamos a construir ?
O mundo mudou e para pior. Existe quem faça por isso.
- Promovem a insegurança para venderem a segurança.
- Promovem a necessidade para venderem ao consumo-dependente o produto.
- Promovem a "Ideia de ser feliz" para venderem a felicidade.
Olá Zorze,
ResponderEliminarQuando volto á minha rua, se não for o eco, o mesmo que ouvia quando puto ria e gritava com os meus amigos, nem a cor das casas, as caras ou as vozes me dizem nada bom, só frustração, mas, fomos nós - os portugueses - que permitimos esta realidade.
Cumprimentos.
Amigo Zorze,...face ao exposto também fico quieto ! Forte abraço!!
ResponderEliminar"raça humana"???? Nunca ouvi tal "conceito", a não ser de liberais!
ResponderEliminarPois se os cães têm raça, ex: bull terrier, pastor alemão, caniche, etc, etc, será a ESPECIE humana menos que a canina????
A definição de racismo, é qdo uma raça pretende aniquilar outra, quem diz raça tb poderá falar de outra sub-divisão, a etnia, a História da ESPECIE humana já nos deu alguns exemplos de puro racismo, senão vejamos: Ruanda, 2ª grande guerra (embora aqui com caracter económico, pois os hebreus pretendiam controlar a economia europeia, tal como hoje o fazem nos EUA),entre outras guerras tribais, conforme se pode consultar em qualquer enciclopédia!!
Eu sou caucasiano (vulgo, Branco), e tenho muito orgulho nisso, se sou de raça pura, talvez não, deverei ter genes celtas, lusitanos, visigóticos, e mesmo hebraicos. O "racismo q se fala hoje em dia, é o dos oportunistas, q se agarram a esse termo para alcançarem os seus fins.
E porque não falar da nova constituição da Africa do Sul, q no caso de vaga para um emprego, terá prioridade quem for negro????
Não tenhas dúvida, estamos a "fazer" uma geração, esta sim, "rasca".
ResponderEliminarHá culpados, claro que sim. O sistema desumanizado que vivemos, o individualismo vigente, a insegurança que "obriga" as crianças a ficarem em casa, a falta de espaços para brincar (o betão tomou conta dos mesmos), as chamadas novas tecnologias que estão a ser digeridas em doses indústrias pela juventude (a meu ver mal, tudo tem de ser consumido com conta, peso e medida), a tudo isto se juntar-mos o desemprego, a precariedade, torna-se numa bola de neve difícil de conter
Abraço
Olá Zorze
ResponderEliminarantigamente as pessoas que gostavam de carne costumavam dizer que "peixe não puxava carroça"
As comissões de moradores existiram, até aos Governos Provisórios eram de grande utilidade, mas claro era o Poder Popular, a democracia participativa, o que interessava ao grande capital não era isso, mas sim o voto de 4 em 4 anos, e não se incomodem que nós resolvemos as coisas, foi então criado o indevidoalismo, que nos conduziu ao ultra liberalismo, com nuances de fascismo.
Sobre os homens, independentemente, da côr ou religião (raça)para mim não faz sentido, os guetos esses sim, existem e, são a consequência, das políticas mal aplicadas em cada caso,e no global.
Abraço companheiro
Zorze
ResponderEliminarTambém falo á brava da minha infância como já dste por isso.
Mas tenho uma faceta pouco bonita a confessar, até á minha adolescencia, como Camarra de gema, desconhecia o Barreiro da Avenida da Républica para cima, aliás o meu pai por brinadeira dizia "Aninhas das cancelas para cima é África...", mas era um mundo á parte.
Quando juntei os trapinhos e fui viver para a Verderena, lá em casa tiveram um desgosto, parece que tinha emigrado.
Mas ainda assim na infância no Barreiro velho e Barreiro centro, brincar era na rua, sempre, e os amigos não se mediam pela cor de pele, pela marca dos sapatos ou pela prfissão dos pais.
beijocas
Estas histórias (e outras) fazem-me recordar também tempos de férias vividos na aldeia do meu velhote, curiosamente também para as bandas de Viseu.
ResponderEliminarAs (histórias) da cidade também me fazem regressar aos anos da infância/adolescência e ao bairro onde cresci. Os jogos do pião, do guelas, da carica no passeio, o salto ao eixo, a burrinha feita, o alho, etc. Enfim, tudo o que já não existe e que foi trocado pelos computadores, consolas e outras tecnologias tais. Quanto à convivência não era tão sã como a que tu relatas, apenas tinhamos que coexistir, mas também a fauna não é de perto nem de longe a de hoje. Quando lá regresso, dos "meus tempos" ninguém, ou quase ninguém, apenas brasileiros, romenos, russos, ucranianos, cabo-verdeanos...
Sinais dos tempos.
Saudações do Marreta.
Amigo Zorze, é bom lembrarmos do passado, dos tempos de juventude. Hoje já não é assim e cada vez esta pior, por vezes até temos receio de sair de casa.Vamos ver se muda.
ResponderEliminarUm Abraço.